Como é de conhecimento, no âmbito do contencioso administrativo federal o CARF editou a súmula nº 11 no sentido de que: “não se aplica a prescrição intercorrente no processo administrativo fiscal“.
Sobre o assunto, o artigo 1º da Lei nº 9.873/99 determina a aplicação da prescrição intercorrente para afastar a cobrança de créditos não tributários discutidos em processo administrativo que ficou paralisado pelos seguintes prazos:
“Artigo 1º — Prescreve em cinco anos a ação punitiva da Administração Pública Federal, direta e indireta, no exercício do poder de polícia, objetivando apurar infração à legislação em vigor, contados da data da prática do ato ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado.
§1º. Incide a prescrição no procedimento administrativo paralisado por mais de três anos, pendente de julgamento ou despacho, cujos autos serão arquivados de ofício ou mediante requerimento da parte interessada, sem prejuízo da apuração da responsabilidade funcional decorrente da paralisação, se for o caso”.
Embora o entendimento do CARF não faça qualquer distinção entre crédito tributário e crédito não tributário, o art. 5º da mesma lei prevê a exceção de que apenas os processos e procedimentos de natureza tributária não serão objeto de prescrição intercorrente.
Considerando a impressão do termo processo de natureza tributária, é possível entender que os processos em que se discute créditos não tributários não estão sujeitos à aplicação da prescrição intercorrente. Isto porque, se a norma do artigo 5º da Lei nº 9.873/98 estabelece a inaplicabilidade da prescrição intercorrente aos processos e procedimentos tributários, por outro lado, ela não impossibilita a aplicação da prescrição aos processos e procedimentos não tributários, que também são julgados pelo rito do Decreto nº 70.235/72.
Contudo, os Conselheiros do CARF têm aplicado a aludida súmula de forma indistinta para afastar a possibilidade de reconhecer a prescrição intercorrente, seja para o julgamento de créditos tributários, seja até mesmo para os créditos de natureza não tributários, como, por exemplo, os casos de multa aduaneira.
Uma das principais críticas dos juristas é fato de que os acórdãos precedentes que embasaram a Súmula nº 11 não trataram efetivamente da aplicação da prescrição intercorrente disposta na Lei nº 9.873/98, tampouco sobre a única exceção aos processos que discutem créditos de natureza tributária.
Ainda, vale destacar o relevante entendimento sobre a regra do voto de qualidade do artigo 19-E da Lei nº 10.522/2002, aplicável apenas para o “processo administrativo de determinação e exigência do crédito tributário”. A propósito, após a edição da Portaria ME nº 260/2020, claramente diferenciou-se o processo de exigência do crédito tributário das demais espécies de processos de competência do Conselho (tais como os processos de crédito não tributário em matéria aduaneira).
Em outras palavras, novamente o legislador optou pela natureza do crédito, não discorrendo sobre a questão de os créditos tributários e os créditos não tributários julgados possuírem o mesmo rito no CARF.
Tanto assim é, que de forma incoerente, a 3ª Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais prolatou o acórdão nº 9303-010.620, por meio do qual fixou o entendimento de que não se aplica a nova regra do voto de desempate aos casos que não tratam de crédito tributário, como é o caso das multas aduaneiras.
Não visualizamos razão plausível para a aplicação do voto de qualidade deve se fazer uma distinção entre créditos tributários e não tributários, mas para a aplicação da prescrição intercorrente não é razoável adotar tal distinção?
Apesar da contradição, percebemos uma semelhança entre os contribuintes de ambos os casos, qual seja, o resultado prejudicial.
Em que pese esse posicionamento da Administração, é possível identificar decisões favoráveis no âmbito judicial, especialmente no âmbito dos Tribunais Regionais Federais da 2ª e 3ª (multa aduaneira) Região, bem como o TRF da 4ª Região (multa cobrada por infração de interposição fraudulenta de terceiros na importação).
E, recentemente, uma decisão proferida pela Justiça Federal do Rio de Janeiro lançou uma nova luz sobre o tema ao julgar procedente a ação anulatória ajuizada pelo contribuinte visando a aplicação da prescrição intercorrente para a cobrança de multa decorrente da suposta ausência na prestação de informações, justamente por constituir infração formal de natureza não tributária. No caso, o juiz considerou que transcorreu prazo superior a três anos, sem que ocorresse qualquer causa interruptiva da prescrição.
O precedente traz maior segurança aos contribuintes, que devem buscar o Poder Judiciário para a aplicação da prescrição intercorrente. Dentre as alternativas, o imediato ajuizamento de ação (sem o término do processo administrativo) traz vantagens em buscar o êxito sem a necessidade de apresentar garantias, pois a ação judicial seria restrita a esse ponto, inexistindo, assim, a dispensa da discussão de mérito no âmbito do contencioso administrativo.
Por fim, no mesmo contexto, chamamos a atenção para a possibilidade de, cumulativamente, também questionar a incidência dos juros de mora na hipótese de inexistir decisão administrativa dentro do prazo de 360 dias a contar do protocolo, estabelecido pela Lei nº 11.547/2007. O nosso sócio Jimir Doniak Jr., já discorreu sobre esse assunto na revista eletrônica Consultor Jurídico (https://www.conjur.com.br/2019-jun-27/jimir-doniak-cobranca-juros-mora-demora-administracao).
A Advocacia Lunardelli fica à disposição para prestar maiores esclarecimentos e para auxiliar em quaisquer necessidades sobre o assunto.
Atenciosamente,
Paulo Eduardo Mansin
Coordenador – Contencioso Administrativo
Pedro Ernesto de Albuquerque
Advogado