A 1ª Turma da 3ª Câmara da 3ª Seção do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) decidiu, por maioria de votos (4×2), que o termo “praça”, previsto no artigo 195, inciso I, do Regulamento do IPI (RIPI/2010), deve ser entendido como o município em que se situa o estabelecimento remetente da mercadoria.
Além disso, o colegiado reconheceu a aplicação retroativa da Lei nº 14.395/2022, que introduziu definição expressa nesse sentido, ao concluir que a norma possui caráter interpretativo, aplicável, portanto, a períodos anteriores à sua edição, nos termos do artigo 106, inciso I, do Código Tributário Nacional (CTN).
O caso teve origem em auto de infração lavrado contra empresa industrial pela suposta subavaliação do valor tributável mínimo (VTM) do IPI em operações com empresa interdependente, entre janeiro de 2014 e abril de 2015. Ambas estavam localizadas na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, nos municípios do Rio de Janeiro (PROCOSA) e de Duque de Caxias (L’Oréal Brasil).
A fiscalização havia sustentado que as operações entre as empresas configurariam planejamento tributário abusivo, com o objetivo de reduzir artificialmente a base de cálculo do IPI. Para tanto, tinha aplicado conceito ampliado de “praça”, abrangendo toda a região metropolitana, e apurado o VTM com base nos preços praticados pelos distribuidores interdependentes.
A contribuinte, por outro lado, havia sustentado que “praça” deveria ser entendida como o município do estabelecimento remetente, conforme consulta formal anteriormente respondida pela Receita Federal, a qual vinculava tanto a administração quanto a própria empresa.
Ao analisar o caso, a maioria dos conselheiros reconheceu que o conceito de “praça” havia sido objeto de interpretações divergentes ao longo do tempo, gerando insegurança jurídica. Nessa linha, entendeu que a Lei nº 14.395/2022 não inovou no ordenamento, mas apenas esclareceu o alcance do termo já previsto no RIPI, razão pela qual deveria ser aplicada retroativamente.
Com base nesse raciocínio, o colegiado concluiu que “praça” corresponde ao município do estabelecimento remetente, afastando a interpretação fazendária que incluía regiões metropolitanas no conceito.
De outro lado, no início de agosto, a 3ª Turma da Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais havia negado a retroatividade da Lei 14.395/2022 Isso porque, segundo o colegiado, a lei não teria caráter interpretativo, já que o texto não traz nenhuma indicação nesse sentido. Além disso, ao usar a expressão “passa a vigorar”, o legislador teria deixado claro que a nova regra só valeria a partir da data da publicação da lei. Assim, antes dessa data, o termo “praça” não poderia ser entendido como “Município”, e essa equiparação só teria passado a valer após a entrada em vigor da nova lei.
Entretanto, a decisão mais recente da a 1ª Turma da 3ª Câmara da 3ª Seção do CARF, antes mencionada, adotou entendimento diverso, reconhecendo que a Lei nº 14.395/2022 teria caráter interpretativo, por ter apenas esclarecido um conceito já existente na legislação. Com isso, o colegiado entendeu que os efeitos da norma poderiam alcançar fatos geradores ocorridos antes de sua publicação, admitindo, portanto, sua aplicação retroativa.
Como se percebe, essa decisão mais recente é relevante por evidenciar que o tema ainda não está pacificado no âmbito do CARF. O precedente demonstra a existência de entendimentos divergentes quanto à retroatividade da Lei nº 14.395/2022 e à definição de “praça” para fins de definição do valor tributável mínimo do IPI, reforçando a importância do acompanhamento das futuras manifestações do Conselho sobre a matéria.
Ademais, o precedente poderá impactar autuações anteriores em que a Receita Federal tenha adotado interpretação ampliada do conceito de “praça”, especialmente em casos envolvendo operações entre estabelecimentos interdependentes situados em municípios distintos de uma mesma região metropolitana.
Em um cenário ainda marcado por discussões quanto à apuração do valor tributável mínimo e à aplicação de conceitos interpretativos no âmbito do IPI, nossa equipe permanece atenta à consolidação desse entendimento e à sua repercussão prática, colocando-se à disposição para esclarecer dúvidas sobre os potenciais impactos desse entendimento e para avaliar, de forma técnica, eventuais medidas cabíveis em situações semelhantes.
Atenciosamente,
Alexander Silvério Cainzos
Sócio – Tributos Indiretos
Carolina Alcantara
Advogada – Contencioso