Julgamento pelo STJ da tributação dos benefícios de ICMS

27 de abril de 2023

A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça – STJ analisou ontem, 26/04/2023, o REsp nº 1.945.110 e o REsp nº 1.987.158, a propósito do tema da tributação, pelo IRPJ e CSLL, dos valores de benefícios fiscais de ICMS. Como ficou evidente em notícias nos meios de comunicação dos últimos dias, a decisão que seria tomada passou a ter uma relevância muito grande.

Inicialmente, deveria ser decidido se seria possível excluir os benefícios fiscais relacionados ao ICMS (tais como redução de base de cálculo, redução de alíquota, isenção, imunidade, diferimento, entre outros) da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, como extensão do entendimento firmado no EREsp nº 1.517.492/PR, que excluiu o crédito presumido de ICMS das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL.

Infelizmente, o julgamento foi confuso, assim como a decisão proclamada.

A sessão foi agitada desde o seu início, em razão de decisão proferida pelo Min. André Mendonça, do Supremo Tribunal Federal – STF, que determinou a suspensão do julgamento do STJ. Ele assim o fez atendendo pedido apresentado no Recurso Extraordinário nº 835.818. Nesse processo, em trâmite no STF, discute-se a possibilidade de tributação, pelo PIS/COFINS, de créditos presumidos de ICMS. Há certa proximidade entre as discussões a respeito da tributação, pelo IRPJ/CSLL, de quaisquer benefícios de ICMS, em debate no STJ, e a respeito da tributação, pelo PIS/COFINS, de crédito presumido de ICMS, em debate no STF. O Min. André Mendonça entendeu, então, o julgamento pelo STJ representaria um perigo de dano irreparável e a necessidade de salvaguardar o resultado útil da prestação jurisdicional a ser providenciada pelo STF em seu processo. Daí sua decisão de suspender o julgamento pelo STJ.

Os Ministros da Primeira Seção do STJ afirmaram terem sido comunicados da decisão do STF quando já tinham iniciado seu julgamento. Por isso, concluíram que poderiam continuá-lo, que apenas teria sua eficácia suspensa pela decisão proferida pelo Min. André Mendonça.

As teses fixadas pela Primeira Seção foram as seguintes:

  1. Impossível excluir os benefícios fiscais relacionados ao ICMS – tais como redução de base de cálculo, redução de alíquota, isenção, diferimento, entre outros – da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, salvo quando atendidos os requisitos previstos em lei (artigo 10 da Lei Complementar 160/2017 e artigo 30 da Lei 12.973/2014), não se lhes aplicando o entendimento firmado no EREsp 1.517.492, que excluiu o crédito presumido de ICMS das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL.
  2. Para a exclusão dos benefícios fiscais relacionados ao ICMS – tais como redução de base de cálculo, redução de alíquota, isenção, diferimento, entre outros – da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, não deve ser exigida a demonstração de concessão como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos.
  3. Considerando que a Lei Complementar 160/2017 incluiu os parágrafos 4º e 5º no artigo 30 da Lei 12.973/2014 sem, entretanto, revogar o disposto no seu parágrafo 2º, a dispensa de comprovação prévia, pela empresa, de que a subvenção fiscal foi concedida como medida de estímulo à implantação ou à expansão do empreendimento econômico não obsta a Receita Federal de proceder ao lançamento do IRPJ e da CSLL se, em procedimento fiscalizatório, for verificado que os valores oriundos do benefício fiscal foram utilizados para finalidade estranha à garantia da viabilidade do empreendimento econômico.

A primeira tese nos parece ter ficado clara. Ela consistiu, primeiro, em manter a decisão proferida anteriormente pela Primeira Seção do STJ no EREsp nº 1.517.492, no sentido de afastar a tributação, pelo IRPJ/CSLL, do benefício de ICMS consistente em crédito presumido, em razão do chamado “Pacto Federativo”. Com isso, infere-se que o STJ entende não aplicáveis a esse tipo de benefício os requisitos previstos no artigo 10 da Lei Complementar nº 160/2017 e no artigo 30 da Lei nº 12.973/2014.

Em segundo lugar e de outro lado, o entendimento anterior da Primeira Seção (de não tributação em razão do “Pacto Federativo”) não seria aplicável a outros tipos de benefícios de ICMS (p. ex., isenção e redução de base).

Já as teses nºs 2 e 3 têm redações confusas e até mesmo aparentemente contraditórias.

A tese nº 2 parece acolher a compreensão de que os demais benefícios de ICMS (que não o crédito presumido) também devem ser excluídos das bases de cálculo do IRPJ/CSLL, mas em razão da Lei Complementar nº 160/2017 e de sua alteração na redação do artigo 30 da Lei nº 12.973/2014. Segundo o entendimento de muitos, essas regras teriam equiparado quaisquer benefícios de ICMS a subvenções para investimento, determinando que fossem aplicados àqueles o tratamento destas. Por isso, a exclusão impor-se-ia independentemente de o benefício de ICMS ser concedido como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos. Desse modo, como consta da tese nº 2, para a exclusão “(…) não deve ser exigida a demonstração de concessão como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos”.

A tese nº 3, porém, declara que a Receita Federal poderia lançar IRPJ/CSLL “(…) se, em procedimento fiscalizatório, verificar “(…) que os valores oriundos do benefício fiscal foram utilizados para finalidade estranha à garantia da viabilidade do empreendimento econômico”. O ponto que suscita dúvida é que esse trecho poderá ser utilizado pela Receita Federal para afirmar que a não tributação está condicionada a que o contribuinte utilize os valores do benefício especificamente no empreendimento econômico. Ou seja, a não tributação só ocorreria se o contribuinte demonstrasse ter dado tratamento próprio de subvenção para investimento, de utilizar o recurso do benefício em empreendimento econômico específico, como, p. ex., para adquirir bens do ativo fixo de uma fábrica.

Não nos parece que essa seja a melhor interpretação do conjunto das teses nºs 2 e 3. Entendemos que a Primeira Seção do STJ aceitou a interpretação de que a Lei Complementar nº 160/2017 determinou a aplicação aos benefícios de ICMS do tratamento próprio de subvenção para investimento. Desse modo, basta a constituição da reserva de incentivos fiscais no patrimônio líquido, não distribuível aos sócios, para alcançar o efeito de não tributação pelo IRPJ/CSLL.

A tese nº 3 teria o objetivo de deixar expressa a não aceitação de práticas distorcidas e abusivas, pelas quais, mesmo constituindo a reserva, os valores dos benefícios de ICMS são desviados, não se destinando ao empreendimento econômico que a empresa desenvolve e que o Estado beneficia. Seriam casos, por exemplo, de uma empresa adquirir um bem imóvel para uso particular do sócio, ou concessão de um empréstimo de longo prazo ao sócio sem juros. Em hipóteses como essa poderia restar evidenciado que, mesmo com a constituição da reserva, os valores oriundos do benefício fiscal teriam sido utilizados para finalidade estranha à garantia da viabilidade do empreendimento econômico.

Contudo, entendemos ser inegável que a redação das teses definidas é confusa. Ela suscitará divergências de interpretação entre os contribuintes e a Administração Fiscal e, com isso, restará mantido o cenário de insegurança jurídica.

Esperamos que, com a publicação do acórdão e eventuais embargos de declaração, as dúvidas possam ser dissipadas.

De qualquer maneira, a nosso ver o julgamento proferido pela Primeira Seção do STJ está com sua eficácia suspensa, em razão da decisão proferida pelo Min. André Mendonça, do STF. O próprio STJ parece reconhecer esse tratamento, como se infere da notícia sobre o julgamento no “site” do STJ.

Acreditamos que a decisão do Min. André Mendonça logo será submetida ao Plenário do STF, para ser referendada ou não. Não é viável descartar qualquer possibilidade, porém, a Advocacia Lunardelli acredita que a tendência do STF é de não referendar essa decisão. Nessa hipótese, o julgamento de ontem pela Primeira Seção do STJ passará a ter efeitos processuais.

Em suma de todo o exposto e na opinião da Advocacia Lunardelli:

  • A decisão da Primeira Seção do STJ está com sua eficácia suspensa, até que o Plenário do STF examine a decisão proferida pelo Min. André Mendonça.
  • A Primeira Seção do STJ reafirmou sua decisão anterior, no sentido de o benefício de ICMS de crédito presumido não pode ser tributado pelo IRPJ/CSLL em razão do chamado “Pacto Federativo”, independentemente de requisitos contidos na Lei Complementar nº 160/2017 e no artigo 30 da Lei nº 12.973/2014.
  • Está confusa a redação da tese fixada a respeito da tributação pelo IRPJ/CSLL dos demais benefícios de ICMS e permanecerá a insegurança jurídica ao menos até a publicação do acórdão do julgamento ou até a análise de eventuais embargos de declaração.
  • Entendemos que a melhor interpretação da decisão da Primeira Seção é que, se for constituída a reserva de incentivos fiscais não distribuível aos sócios, os demais benefícios de ICMS não podem ser tributados pelo IRPJ/CSLL, a não ser em casos de desvio/abuso, quando os valores dos benefícios são utilizados para finalidades estranhas à garantia da viabilidade do empreendimento econômico.

A Advocacia Lunardelli permanece à disposição em caso de dúvidas.

 

Jimir Doniak Jr.

Sócio – Tributos Diretos

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